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O leitor deve se lembrar que Dilma Rousseff perdeu o mandato por atrasar o repasse de recursos do governo aos bancos públicos para pagar benefícios sociais (entre eles, o próprio Bolsa Família) e, assim, ultrapassar o teto de gastos ("pedaladas"). Essa é uma história mal contada: Dilma foi impedida de governar porque perdeu a base política. Mas não há espaço para essa discussão agora. A história fará o seu próprio julgamento.
Surfando na onda do auxílio emergencial (que nem foi ideia dele!), e de olho na eleição de 2022, Bolsonaro pediu para Paulo Guedes criar um substituto do Bolsa Família. Surgiu o programa "Renda Brasil", cujo financiamento eliminava vários outros programas sociais, como o FAT, Farmácia Popular, congelava aposentadorias, etc. Bolsonaro ficou uma fera. Isso significa "tirar dinheiro dos pobres para dar aos paupérrimos", disse ele, proibindo de falar mais nesse assunto.
Alguém acredita na palavra de Bolsonaro? Pouco mais de uma semana depois, com a presença do próprio presidente, Paulo Guedes, e outros ministros, o líder do governo na Câmara (Ricardo Barros, PP-PR), anunciava o "Renda Cidadã". As fontes de financiamento seriam duas: a) 5% dos recursos novos do Fundo de Educação Básica, o Fundeb, cujo valor foi aumentado em agosto passado (de 10% para 23%) pelo Congresso e b) limitar o pagamento de precatórios a 2% das receitas correntes líquidas da União, usando os recursos restantes para o financiamento do novo programa. Essas duas fontes de financiamento se somariam ao orçamento do Bolsa Família (que deixaria de existir com esse nome), estimado em R$ 35 bilhões em 2021.
Pelo seu analfabetismo econômico, Bolsonaro paga um preço alto. Virou refém do ministro da Economia. Dono da "chave do cofre", Guedes é um "inimigo na trincheira" que virou ameaça. Ele criou uma nova modalidade de "pedalada" para furar o teto de gastos e Bolsonaro "caiu como um patinho". Isso dá impeachment, deve ter lembrado algum dos seus novos amigos do "centrão". Mesmo eles, acostumados à arte da traição, teriam dificuldade em fazer passar tamanho "elefante branco" no Congresso. Ainda mais que seria uma PEC, que precisa de mais votos.
O Fundeb é o principal mecanismo de financiamento da educação básica no país e não está sujeito ao teto de gastos. Já os precatórios são dívidas da União, reconhecidas após decisão definitiva na Justiça. Não cabe mais recurso. Elas são despesas incorporadas na previsão orçamentária de cada ano com previsão de fonte de recurso. Ao propor pagar uma quantia mínima dos precatórios a cada ano, o governo desvia o restante para o "Renda Cidadã" e deixa os credores na fila para receber a "ver navios". Sem contar que muitos, devido à morosidade da Justiça, correm o sério risco de morrer sem receber nada.
Uma pessoa sem meias palavras, diria que o governo está roubando o dinheiro das criancinhas e dando calote nos velhinhos. A esperteza permitiria a Guedes remanejar cerca de R$ 40 bilhões dentro do teto de gastos. Quer "pedalada" maior do que essa? Em favor de Dilma, pelo menos pode ser dito que ela apenas "segurou" o repasse aos bancos, tendo liquidado a dívida em 2015 (tarde demais, pois seu destino já estava selado). Já Guedes quer aumentar a dívida, contraindo mais dívidas, e projetando o pagamento dos precatórios para as "calendas gregas".
A austeridade fiscal de Paulo Guedes já não cabe mais no novo figurino do governo. O apoio do "centrão" custa caro. A fumaça da fritura já chegou na Câmara. Rodrigo Maia não recomendou o filme A Queda, sobre os últimos dias de Hitler num abrigo subterrâneo, sem motivo. Onde há fumaça, há fogo!